O 3º Ceasa Gourmet realizado no Ceasa Campinas (SP), dentre tantas atividades gastronômicas trouxe a chef Andréia Pimentel, da Universidade São Francisco, que apresentou a primeira vista um fato curioso; a antropoentomofagia, ou seja, o consumo de insetos pelo homem.
A Entomofagia é um fenômeno historicamente antigo e geograficamente disseminado. Pode-se dizer que a entomofagia surgiu com os primeiros hominídeos e atualmente está presente em mais de 100 países ao redor do globo. Das centenas de milhares de espécies de insetos já catalogadas, mais de 1700 são utilizadas como alimento por cerca de três mil grupos étnicos pelo mundo. Observou-se que o consumo de insetos não é tão incomum, apresentando um forte potencial de crescimento para soluções de alguns problemas ambientais e como auxílio ao combate a fome no mundo. Muitas pesquisas vem sendo feitas, porém há a necessidade de intensificação das mesmas para que se possa identificar as espécies que podem ser consumidas sem trazer danos à saúde de quem os ingira, como também as formas adequadas de preparo e conservação.
Segundo a chef Andréia Pimentel, comer insetos ajuda na questão da sustentabilidade e no fornecimento de proteínas, de uma maneira mais saudável e de melhor forma de cultivo. “A carne bovina é interessante sim, mas o quanto ela consome de recursos naturais (água, pasto) pra se manter um boi, nos traz consequências climáticas. Os insetos podem ser cultivados em terrários. As pessoas dizem: ‘credo, esse bicho é feio!’ Mas se você olhar para o camarão, ele não é bonito – o camarão tem uma função de comer a carniça do mar. Então, porque não comemos o grilo e comemos o camarão? É a questão da cultura brasileira, a gente olha os insetos como uma coisa suja porque desde pequenos eliminamos os insetos com inseticidas, porque eles também vivem no esgoto. É uma questão da cultura mesmo. Mas o sabor, quando vamos adaptar o palato é mais fácil você se adaptar com o sabor do inseto (que está entre nozes e milho) do que o camarão que tem um sabor bem mais forte (como o polvo e a lula, em relação ao sabor dos insetos”, explicou.
“O tenébrio é uma larva pré-grilo, ele é pequeno, cresce e se transforma no grilo. O grilo tem sabor de ‘milho’ e é importante na alimentação de quem pratica atividades físicas, pois tem alto valor proteico. O grilo tem uma absorção de proteína muito maior do que as proteínas do leite. Então, é uma fonte de absorção. O peixe e a carne branca tem 23% de absorção no organismo e com a ingestão do inseto a absorção pode chegar a 60% — os insetos tem sangue frio, a absorção no nosso organismo é mais rápida que os mamíferos de sangue quente e, os peixes de carne branca”, ela esclarece.
“Será que dá pra chegar no Ceasa e escolher um potinho de cada um? Escolhendo qual é o tenébrio bonitinho, qual não é? Não! No Brasil, a gente está acostumado com eles nas farinhas, farinhas de formiga – a içá que é brasileiro e do sudeste, no norte é comum a saúva-limão. A gente (chefs) acredita que no país (no mercado de investimento), os insetos vão entrar na forma de farinha”, prevê Andréia.
A cozinha asiática são os precursores desta prática
Chef Susuki, também professor da USF, especialista em cozinha asiática, divide com a chef Andréia a parte de entomofagia. Durante o 3º Ceasa Gourmet, o chef preparou o ‘Macarrão da Malásia’ – o megoren. Usou o camarão (que todos gostam), a carne bovina e os tenébrios frios na composição da receita. Antes de começar a receita, o chef salteou baratas de Madagascar no azeite, juntamente com os grilos. Segundo a chef Andreia, “o ponto da barata é quando começa expandir os anéis (estufa o abdômen)”. Ela ainda chamou a atenção para o fato de que esses insetos são criados especialmente para o consumo humano. “A intenção aqui é mostrar que tem como substituir a fonte de proteína, pela proteína dos insetos. O aracnídeo escorpião tailandês são calmos e estratégicos, vivem sozinhos. Não consumimos tanto os aracnídeos porque eles se reproduzem menos. O consumo dá prioridade aos insetos que se reproduzem mais rápido – com sabor que lembram pinhão e um pouco mais adocicado. Todos os potes de insetos aqui usados são certificados e identificados”.
Receita de “Macarrão da Malásia”, do chef Susuki
O chef salteou os tenébrios (grandes), os grilo e baratas (menores), para compor o ‘macarrão asiático’. Susuki diz, “o macarrão migoren (mi: macarrão / goren: salteado) é considerado um dos melhores da Malásia. Na verdade, eu nem precisaria usar o camarão e a carne bovina como fonte de proteína mas, eu vou usar para dar sabor especial para o paladar de vocês – poderia usar somente os insetos”.
Outros ingredientes usados são: filé mignon, camarão sete barbas, o macarrão, espinafre, cebolinha, broto de feijão-verde, cenoura cortada em Julienne (tirinhas fininhas, esses cortes da cultura asiática são justamente para uma cocção mais rápida); cebola e uma mistura de alho, gengibre e pimenta dedo-de-moça; omelete cortada fininha (porque na Ásia o ovo está presente em todos os pratos); o nanplat é o caldo de peixe fermentado salgado; óleo de gergelim (pra perfumar a receita, no final) e óleo de soja.
Modo de fazer
Chef Susuki ensina: “na frigideira, colocar o óleo de soja, pimenta, alho e gengibre para perfumar o óleo (extraindo o sabor dos temperos). Agora vou saltear as proteínas: filé mignon, camarão, a cebola e a cenoura, o broto de feijão, espinafre, por último o macarrão (pré-cozido) com a proteína dos insetos – que vai dar a crocância do prato. Na Ásia, se faz uso do sal – ou usa-se shoyo ou o molho de peixe (bem salgado). Vou perfumar com o óleo de gergelim. Espalho a cebolinha e o omelete picadinho. Esse é o prato original da Malásia e agora vou complementar com os insetos”, finalizou.